Empresários e políticos sob a lupa: a sombra do PCC se estende à Bolívia


Campinas, São Paulo. — A captura de dois empresários brasileiros em fevereiro de 2025, em Campinas, acusados de lavar dinheiro para o Primeiro Comando da Capital (PCC), desencadeou uma investigação que hoje atravessa fronteiras e ameaça expor uma rede de vínculos entre máfias criminosas, empresários e políticos no Brasil, Paraguai e Bolívia.
A operação, liderada pelo procurador da Justiça Federal Mauricio Vieira Filho, permitiu o acesso a informações classificadas que revelariam como o PCC expandiu sua estrutura financeira e operacional além de São Paulo, utilizando uma fórmula já testada: penetração em instituições estatais, cooptação de empresários e financiamento de campanhas políticas.
O preço de investigar o PCC
Após essa operação, surgiu uma ordem para eliminar o procurador Vieira Filho. De acordo com fontes próximas ao caso, a decisão teria partido do próprio líder do PCC, Sérgio Luiz de Freitas Filho, conhecido como “Mijão”, que — segundo as investigações — se transferiu para Santa Cruz de la Sierra, Bolívia, com o objetivo de reforçar sua segurança pessoal e articular novas rotas de armas, drogas e capitais.
Os investigadores afirmam que “Mijão” replicou na Bolívia a estratégia consolidada em São Paulo: tecer relações com empresários, funcionários públicos, jornalistas e até candidatos presidenciais, buscando blindagem política e judicial em troca de financiamento.

O golpe no Rio e a surpresa política
Em setembro de 2025, uma nova operação no Rio de Janeiro resultou na detenção do deputado Tiego Raimundo dos Santos Silva junto a outras 15 pessoas, entre elas integrantes do PCC e do Comando Vermelho (CV), a organização criminosa mais poderosa do Brasil.
O que surpreendeu os investigadores foi a evidência de um pacto criminoso entre facções rivais, com o objetivo de estabelecer um corredor de drogas e armas do Brasil até a Bolívia, especificamente em Santa Cruz de la Sierra, onde teriam sido acertadas entregas de dinheiro e favores para corromper instituições públicas, policiais e empresários.
Conversas explosivas
Entre as provas apreendidas — mais de 10 mil arquivos entre áudios, vídeos e mensagens de texto — destaca-se o surgimento de supostas conversas entre “Mijão” e um empresário boliviano do setor tecnológico, identificado nos relatórios como J.P.V., atual candidato à vice-presidência na Bolívia.
Os áudios, ainda em perícia, revelariam um acordo datado de fevereiro de 2025 para “comprar” sua candidatura com dinheiro proveniente de facções criminosas, com a promessa de habilitar na Bolívia um novo centro de operações para quatro organizações criminosas brasileiras.
Nos mesmos registros fala-se da “repatriação” de 200 milhões de dólares. Metade corresponderia, segundo os investigadores, a capitais associados à maior fraude bancária da Bolívia nas últimas décadas; a outra metade, a fundos ilícitos do PCC derivados do tráfico de armas, drogas e pessoas.
As suspeitas apontam que o dinheiro entraria no país por meio de um suposto fundo de investimento privado administrado por empresas de fachada tecnológicas, para depois ser lavado em projetos imobiliários, tráfico de terras e contratos estatais.

Vínculos no Estado
Em alguns dos áudios também são mencionados possíveis contatos com órgãos-chave como a Agência Nacional de Aeronáutica da Bolívia, responsável por aeroportos e migração. Uma pessoa vinculada a essa entidade, identificada nas transcrições como “J.A.”, teria atuado como elo político e midiático, facilitando conexões no governo e na imprensa.
Uma investigação sob sigilo
As autoridades brasileiras mantêm a investigação sob sigilo judicial, mas foi divulgado que nos próximos meses será solicitada colaboração internacional ao Paraguai e à Bolívia para desarticular a rede.
O temor dos investigadores é que a Bolívia possa se transformar em um novo epicentro de operações criminosas, replicando o ocorrido em São Paulo e no Rio de Janeiro, onde essas organizações deixaram um saldo de milhares de mortos, sequestros e um clima permanente de insegurança.

O desafio regional
Especialistas em segurança consultados apontam que a convergência entre máfias e política representa a ameaça mais grave para a região. “Quando o crime organizado compra candidaturas, não busca poder político: busca impunidade. E essa impunidade se traduz emj territórios controlados por facções armadas, fora do alcance da lei”, explicou um ex-investigador da Polícia Federal do Brasil.
O caso apenas começa a se desenrolar, mas os alertas já estão acesos. Se as conexões entre o PCC, empresários e políticos se confirmarem, a Bolívia poderá enfrentar nos próximos anos o mesmo cenário que hoje sangra as grandes metrópoles brasileiras.